ESTETIKA apoia o Dia Nacional de Luta Contra Queimaduras, celebrado em 6 de junho e que deu origem ao Junho Laranja, uma campanha da Sociedade Brasileira de Queimaduras. Para reforçar a importância da conscientização sobre prevenção e falar sobre o trabalho de reabilitação funcional e estética às vítimas de queimaduras, conversamos com a fisioterapeuta Mariana Negrão, pós-graduada em dermato-funcional, supervisora do estágio de queimados na Universidade Anhembi Morumbi e autora do livro “Abordagens terapêuticas em sequelas de queimaduras”.
Álcool e fogo: mantenha distanciamento. Está aí o tema deste ano do Junho Laranja, uma campanha da Sociedade Brasileira de Queimaduras (SBQ), que foi criada há cerca de dez anos para conscientizar a população e as autoridades quanto à prevenção de acidentes e queimaduras. A escolha do tema faz todo sentido, já que desde 2012 havia a proibição por lei do uso do álcool líquido, que, devido à pandemia, voltou a ser provisoriamente liberado. Uma tentativa de baixar custos e favorecer a distribuição por todo o território nacional. O risco, porém, é que estamos falando de um dos maiores responsáveis por queimaduras no país. “O álcool é um produto inflamável, culturalmente muito presente nos lares brasileiros, principalmente para a limpeza de superfícies e, agora, tem uso estimulado para a prevenção ao coronavírus. Isso aumentou os acidentes com queimaduras porque as pessoas lidam com o produto de forma descuidada, não sabendo o potencial de se queimar”, destaca o presidente da SBQ, o cirurgião plástico com experiência em queimados, reconstrução da mama e cirurgia estética José Adorno.
Não estamos falando de pouca gente. Segundo a própria Sociedade Brasileira de Queimaduras, no Brasil há cerca de 1 milhão de casos de queimaduras por ano, sendo que a maioria acontece dentro de casa. Estima-se que 30% envolvam crianças e o número de internações gira em torno de 150 mil. “Diante de tudo isso, dois dos pontos muito preocupantes é que, devido à Covid-19, crianças estão tendo acesso estimulado ao álcool gel, o que antes não acontecia; e que várias pessoas, mesmo estando em casa, preferem usar álcool em gel ao invés de lavar as mãos com água e sabão e, na sequência, fazem manipulações na cozinha, acendendo fogão, forno e até fumando”, destaca Mariana Negrão. “Queimadura é algo que se pode prevenir, mas, para isso, é preciso estimular a conscientização de que mesmo em gel o álcool continua sendo uma substância altamente inflamável e, por isso, exige cuidado redobrado, especialmente nas mãos dos nossos pequenos. Apesar de existir essa maravilhosa campanha do Junho Laranja e das UBSs também fazerem um excelente trabalho de educação, o tema ainda é pouco divulgado para a população porque pouco se fala sobre ele nos veículos de grande alcance, como televisão, rádio e jornal”, reconhece ela. Isso ajuda a entender a falta de conhecimento não só sobre prevenção, mas também de como proceder no caso de uma queimadura, já que creme dental e borra de café continuam sendo empregados nessas situações.
Cuidado multriprofissional
Dependendo da gravidade da queimadura, o atendimento foca primeiro na tentativa de salvar o paciente para, só depois, realizar enxertos e outras terapias de reabilitação. “É um processo lento, dolorido, penoso, que demanda uma equipe multiprofissional para atuar por um longo período ao lado desse paciente que sofre com alteração física, emocional e também funcional. Afinal, muitos casos de queimaduras atingem áreas de articulações, que limitam as funções de joelhos, cotovelos, punhos, axilas; e outros são tão profundos que destroem até mesmo os músculos, exigindo um trabalho de recuperação e de força muscular. Por tudo isso é que as ações da equipe multiprofissional têm o objetivo de ajudar o paciente a lidar com suas novas restrições, o preconceito, o olhar das pessoas sobre ele, bem como seu retorno à sociedade, que inclui a volta ao trabalho e ao convívio com a família e os amigos, que, não raras vezes, também é prejudicado, levando a quadros depressivos e à necessidade de psicoterapia”, lembra Mariana.
A situação é realmente grave e complexa. Para ter uma ideia, quando a queimadura ocorre na infância, são necessárias 50, 60 ou até mais cirurgias ao longo da vida e também outros procedimentos para que o desenvolvimento seja o menos prejudicado possível e a pele, que fica dura, possa ter mais extensibilidade e flexibilidade. Imagine uma situação dessas quando a queimadura atinge o tronco e leva à má formação das mamas, por exemplo, atingindo em cheio a autoestima feminina.
Recuperação da autoestima
Dependendo do caso, e após a liberação do médico, muitos pacientes recorrem, por exemplo, a micropigmentação. “Há trabalhos belíssimos em sobrancelhas que foram destruídas, lábios deformados, reconstrução de aréolas, entre outros, que ajudam o paciente a se reconhecer novamente no espelho e a resgatar sua autoestima, que fica tão debilitada. Tem caso em que o paciente opta por realizar uma tatuagem sobre as cicatrizes, na intenção de que o desenho transforme as marcas em algo visualmente agradável. Durante o tratamento ainda são feitas várias abordagens terapêuticas, como hidratação e recursos de melhora da flexibilidade da pele. Tudo com a missão de ajudar cada paciente a recuperar o máximo possível da vida que ele tinha antes de um acidente que vai marcá-lo para sempre”, finaliza a professora Mariana Negrão.